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O programa nuclear norte-coreano e a complacência da China nesse processo. Seria a China cúmplice ou

  • Foto do escritor: Guilherme Carvalho
    Guilherme Carvalho
  • 9 de out. de 2017
  • 3 min de leitura

O programa nuclear norte-coreano e a complacência da China nesse processo. Seria a China cúmplice ou opositor?

Muitos dos materiais para a composição de equipamentos, de laboratórios, recursos para pesquisa e de desenvolvimento do programa nuclear norte-coreano passaram, inevitavelmente pelo território e pelos portos chineses. E levando-se em conta que o governo chinês possui não só um vasto aparato de espionagem, como também, podemos imaginar, muitos informantes e contatos inclusive dentro da cúpula do Estado norte-coreano, seria leviano demais pensarmos que a China não sabia de nada ou que não tinha conhecimento do status e do progresso do programa nuclear da Coreia do Norte. Evidentemente, que todo Estado é soberano e, portanto, preserva um alto grau de autonomia em suas operações enquanto em seu território e até recursos para adquirir ativos no exterior com os quais avançar seus diversos objetivos político-diplomáticos, econômicos-comerciais e financeiros, entre outros interesses.

E há evidências que apontam que os norte-coreanos adquiriram os recursos, a tecnologia e os materiais sensíveis para a construção do seu programa nuclear mediante a uma rede global de contatos no mercado negro liderada, inicialmente, pelo cientista nuclear paquistanês e mentor do programa nuclear paquistanês, A.Q. Khan. Há fortes indícios que Khan passou informações altamente sigilosas sobre o desenvolvimento de tecnologias nucleares a Coreia do Norte, Irã e Líbia. Todavia, gostaria de enfatizar que estamos falando de um país extremamente fechado, restrito e hostil ao exterior e que sofre com embargos internacionais variados de muitas regiões do mundo. Por isso, creio que sem algum tipo de apoio ou de omissão logística de Pequim, o governo norte-coreano não teria atingido o nível de desenvolvimento e o acesso aos materiais sensíveis para a construção de uma infraestrutura e de um eventual arsenal nuclear.

Mas qual seria o possível interesse da China em ter uma Coreia do Norte nuclear? Bem, que a China há muito tempo tem como uma das suas principais vertentes de política externa a preservação do regime atual norte-coreano e, consequentemente, da permanência da divisão das Coreias como objetivo geopolítico é de notório saber. Ao manter a Coreia dividida, a China garante que não terá um competidor econômico ainda mais forte no longo prazo, já que, muito provavelmente, uma Coreia unificada seria uma Coreia capitalista e democrática, onde o norte proveria com matérias primas o sul industrializado, em uma economia complementar com grande potencial. Em termos militares, uma Coreia dividida significa que o norte serve de uma área neutra ou “buffer zone” para a China, com isso as tropas norte-coreanas estariam entre a China e o contingente de tropas americanas e sul-coreanas estacionadas na linha que divide as duas Coreias. Uma Coreia do Norte nuclear não só preservaria o regime de Pyongyang no poder, como também desencorajaria qualquer tentativa de avanço das tropas americanas e sul-coreanas para unificar a península. Outro papel importante, em especial sob o ponto de vista geoestratégico e geopolítico chinês, que uma Coreia do Norte nuclear pode servir, é no processo de desmoralização, descrédito e deslegitimação da presença dos Estados Unidos, como “protetor” de alguns países na região do leste asiático.

O fato de os norte-americanos serem o principal pilar da segurança militar tanto dos sul-coreanos, japoneses e taiwaneses quanto como força de apoio de outros países no sudeste asiático, por exemplo, Filipinas, Vietnã, Cingapura, Malásia e Austrália, faz com que a China, em viés de ascensão e de assertividade regional e global, tenha como prioridade de política externa o gradual enfraquecimento e eventual afastamento desses países nas suas alianças com os Estados Unidos, e passem a olhar para China como o parceiro ideal. Até que ponto, o risco de uma Coreia do Norte nuclear, em uma análise de custo-benefício no longo prazo, irá avançar os interesses chineses na região e, em um segundo momento, no contexto global, em relação ao afastamento dos Estados Unidos da zona de influência chinesa na Ásia é algo a ser visto em um futuro próximo. A estratégia da Rússia de pressionar os americanos a manter uma retórica agressiva na Síria, quando o presidente Obama declarou uma “linha vermelha” ou “red line” para uma suposta intervenção, caso houvesse o uso de armas químicas pelas forças do governo sírio contra seus adversários, e, depois, nada aconteceu trazendo descrédito para a influência dos Estados Unidos naquele conflito funcionou. E mesmo com os pífios ataques aéreos norte-americanos a alvos do governo sírio, depois de outro ataque químico, já na administração Donald Trump, ficou claro que os americanos estavam abdicando de atuar com mais protagonismo naquela área. Talvez, os chineses estejam bancando suas fichas em uma estratégia similar, já que o próprio Donald Trump, em várias ocasiões, declarou que os Estados Unidos devem assumir uma postura mais isolacionista e, portanto, não devem agir como uma força de “polícia global”.

David Eduardo Barreto Filho  Cientista político e historiador  Formado na City University of New York - Queens College

David Eduardo Barreto Filho

Cientista político e historiador

Formado na City University of New York - Queens College

Discente do MBA em Relações Internacionais

Fundação Getúlio Vargas

Email: dbrazilianny@aol.com

Facebook: https://www.facebook.com/david.barreto.100

 
 
 

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